domingo, 29 de abril de 2012

Salvei uma foto sua no meu computador hoje. Agora você me olha e sorri sem parar, me olha e mostra seus dentinhos pequenos de criança, me faz sorrir junto. Fico escrevendo sem seguir regras gramaticais pra que você leia e venha me corrigir, me bronquear, perguntar de quê me serviram todos aqueles livros que você deu no natal passado. Eu gosto, de uma certa forma, de erros ortográficos porque são os únicos que eu posso corrigir com algum tipo de certeza, basta admitir, passar o corretivo, escrever de novo e depois disso eu sei que você não vai me olhar como se eu fosse um louco destruidor de corações. Eu não sou, você sabe. Você sabe mas insiste em chorar ofensas sempre que decidimos sentar e conversar civilizadamente na sua sala de estar. A gente até consegue por alguns minutos mas quando percebo, já estou voltando pra casa depois de ter fechado sua porta com toda força que eu tinha reservado pra suportar mais uma discussão. Eu nunca vou direto pra casa quando saio da sua em meio a uma briga, sempre paro em algum bar e fico olhando meninas com dentinhos pequenos que parecem com você mas nunca têm esse seu jeito de não-sei-o-que-tô-fazendo que me faz querer te levar pelo caminho mais fácil, então só aí eu vou pra casa com a certeza de que não há como te encontrar em outras. Salvei uma foto sua no computador hoje e parece que esse é o maior contato que eu posso ter com você. E agora?

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Hoje não

Não há poesia. Não agora. Não em mim ou em meu sofrimento. Sempre fui admiradora das pessoas que conseguem canalizar as dores para a arte, mas eu não consigo. Eu faço textos pela metade, poemas pela metade, vivo pela metade enquanto sofro.
E já nem sei o que é ser inteira.

domingo, 1 de abril de 2012

Quantas vezes teremos que nos afogar para aprender que são com nossas pernas e braços que conseguimos nadar?

domingo, 19 de fevereiro de 2012

por entre fotos e nomes

sem você
menina
fico mais perdido
que Caetano
cantando
sem lenço
sem documento
e eu vou
sem você
por que não?

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Amnésia alcoólica

Hoje comprei uma carteira de cigarros e fumei todos, ou quase. Estou meio tonto, nada demais, como quando eu viro três ou quatro taças de vinho, fico um pouco bêbado mas sempre quero um pouco mais, alguma coisa que me deixe vivo. Que coisa é essa? Eu não sei. Beber ou fumar não têm surtido tanto efeito assim nesse quesito.
Meu corpo dói, será que os cigarros são tão bons assim? Tão bons quanto você e seu pequeno-corpo-frágil que chega, entra na sala do chefe enquanto eu te observo pela janela de vidro e vem em minha direção como se não soubesse o estrago que está fazendo em minha vida? Talvez sejam, acho difícil, já que você não mata desse jeito, não tão rápido, não sem me fazer pensar em cada mínimo erro que cometi.
Nem o álcool nem o cigarro são capazes de fazer o que você faz, pequena, eles não têm esses dois pedaços de céu que me fazem cantar all my loving trezentas vezes em minha cabeça e depois esquecer da música, da vida, do texto.

seus grandes olhos
negros
negam o meu
olhar
voltam-se para outros
e mentem
matam
cortam


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

relógio

tic
o tempo come
meu coração e
some
das prateleiras, eu
passo bem
sem ter a quem
perder
doar
perdoar
tac

sábado, 5 de novembro de 2011

Perigosa tentação

"Casa da serra? Mas... Tudo bem, vamos." Concordei com a ideia que meu pai teve e entrei no carro. Concordei, mas só o fiz para não gerar outra confusão, eu sabia que aquilo nunca iria dar certo. Enfim, arrumei minhas coisas e fui.
Minha mãe, mais calada do que nunca, também entrou no carro e tratou de olhar a paisagem, as placas, o asfalto, as pequenas casas que insistiam em passar rapidamente, olhava para tudo, menos para nós. Era assim que ela brigava, silenciosamente. Vocês já pararam para pensar no caminho que o silêncio faz até chegar na parte qualquer do cérebro que nos faz sofrer? Bom, eu não sei precisamente, mas acho que ele atravessa por cada veia, cada artéria, incomoda cada célula do nosso corpo, e passa nos arranhando, nos cortando, fazendo doer regiões que nós nem nos dávamos conta da existência. Mas isso não importa, a dor não importa, não para nós.
Continuamos calados e aquilo começou a me enlouquecer. Eu sempre gostei dos sons, da música, de imaginar cada palavra derreter e escorrer pelo canto da boca de quem fala cuidadosamente, ou sair como um vômito da boca dos impulsivos.
Aquele silêncio me trazia ímpetos suicidas. Eu queria morrer, queria fugir do mundo, pular daquele carro, queria qualquer coisa que me tirasse dali. Suicídio. Eu acho que sempre tive esse instinto, ou simplesmente era covarde demais para enfrentar meus problemas, não sei. É fácil demais julgar fraco aquele que escolhe por encerrar sua vida, mas é uma tentação, é quase impossível não pensar nisso, não imaginar o drama, a carta-despedida, a culpa que assolará cada um ao passar dos anos. Essa é, porém, uma tentação perigosa, decidir pelo fim de tudo não é fácil e eu já tinha desistido tantas vezes que aquela parecia ser a hora.
Resolvi esperar por uma última conversa, alguma coisa que pudesse vir deles, qualquer coisa. Nada. Comecei a cantar e minhas palavras se perdiam no ar, assim como se perdem as nossas chances quando deixamos para depois. Eu não sabia o que fazer, todas as coisas apontavam para uma só decisão, tudo parecia gritar para que eu fizesse aquilo e fim. Eu não o fiz e só Deus sabe que eu precisei ser muito forte para não abrir aquela porta e pular, dar adeus e me livrar daquilo.
Até hoje não sei o que me fez desistir, só sei que, ao chegar na casa da serra, eu desci do carro e sabia que a minha tentação tinha sido atropelada em algum lugar do caminho, eu não podia ver, mas sabia que aqueles pneus estavam manchados do sangue que eu não derramei. Fui para a casa embaixo de uma leve chuva, olhei para trás e pude ver que, ainda dentro do carro, meus pais se olhavam e se comunicavam, mesmo naquele silêncio amargo, acredito que a ausência de palavras às vezes cai bem. Talvez tenha sido isso que me livrou da morte, talvez o silêncio tenha me segurado ali, como se ainda houvesse esperança de qualquer coisa.
Não sei o que meus pais conversaram, entrei na casa e comecei a escrever, colocar pra fora tudo que me ligasse àquele instinto, porque a tentação, meus queridos, essa eu sei que não vai me largar e talvez eu não queira porque é ela que mantem meus olhos abertos, ela que me faz querer respirar. Perigosa essa tentação que me faz querer morrer, que, ao contrário do que se espera, me liga à vida e me faz esperar sempre um pouco mais de tudo. Um pouco mais de todos. Perigosa mas cada vez mais minha, mais parte de mim.